A vida como ela é

A vida como ela é
Sonhar... Algo que fazemos tão bem. É da natureza do ser humano sonhar. Sonhamos com nosso futuro profissional, familiar, social... e é claro, sonhar leva este nome porque simplesmente faz jus a ele, é algo intimamente ligado à fantasia, à parte agradável dos nossos desejos, caso contrário seria pesadelo.
Para quem não sabe, eu sou produtor musical e é disso que eu vivo. Trabalho como produtor desde 1994 mas meu envolvimento com a música começou lá por volta de 1987 quando cantava em uma banda literalmente de garagem. Depois de um tempo comecei a cantar em "bandas de baile", cantava de tudo e fiz carnavais, casamentos, formaturas, etc... (só pra constar). Mas foi em meados de 1990 que me envolvi com o que veio a se tornar minha profissão. Naquela época fui arrebatado pela curiosidade causada por bandas como KraftWerk (os avós da música eletrônica) New Order , Depeche Mode, Front 242, Information Society, Public Enemy, Run DMC, nem preciso citar Michael Jackson e tantas outros que mesclavam sons elétricos e acústicos com elementos eletrônicos como sintetizadores e os então "recém-popularizados" samplers. Eu sonhava em fazer música como estas bandas faziam, mas era algo muito fora da minha realidade. Fui conseguir meu primeiro teclado com sons profissionais, um Korg M1, em 1992. Não adiantou para quase nada, os sons eram bons mas era necessário muito mais recursos para me alinhar à realidade musical da época. Muito tempo se passou e eu passei muita vontade. Sonhava incessantemente com o dia em que conquistaria todos estes recursos para produzir músicas que chegassem ao sucesso, quem sabe até internacionalmente. Sonhei, sonhei, sonhei... Hoje, 19 anos depois, posso dizer que meu sonho virou realidade, mas não do jeito que sonhei e é aí que está o detalhe. Pela graça de Deus, encontrei estabilidade em minha profissão, trabalho no estúdio e sou produtor do Bola de Neve, que por sinal é maneiríssimo, tenho outro estúdio em casa e sou endorse (parceiro) da maior empresa de tecnologia músical do mundo, a Roland, que me dá acesso ao que existe de mais novo no mercado. As vezes penso que se tivesse toda esta tecnologia 15 anos atrás, estaria milionário... Talvez sim, mas é mais provável que não. Sonhar faz parte da vida, mas viver é realidade e a realidade é o que é, gostemos nós ou não.
Quem não sonha em morar com a família em uma casinha linda, com um quintal idem, gramado, com árvores frutíferas e passarinhos cantantes? Mas quem inclui no sonho a manutenção necessária para manter essa casa? Você se imagina tirando as "tiriricas" que nascem indesejavelmente no gramado, cortando a grama, rastelando as folhas e colhendo as frutas que caem das árvores, podando-as, limpando as calhas da casa, pintando-a uma vez por ano e tudo mais que é preciso para manter a "fotografia ideal"? Pois passe a considerar. Você pode sim, um dia, ter uma casinha com esta exata descrição mas, para mantê-la, é preciso trabalhar muito, pagar faxineira, jardineiro, eletricista, encanador, etc... ou terá que encontrar tempo entre seu emprego, casamento e filhos para executar todas estas outras tarefas. O sonho, quando vira cotidiano, passa a se chamar vida. Então, sonhar é ruim? Não, é ótimo, mas saber viver são "outros quinhentos". Imagine uma pessoa peluda (tipo Tony Ramos) e com cabelo comprido, que sonha em ter em sua casa um banheiro todo branquinho (e sempre branquinho), chão, teto, parede... Se esta pessoa não tiver dinheiro para pagar uma faxineira ou disposição para manter o banheiro limpinho por ela mesma, é melhor sonhar com outra coisa, mesmo porque pelos e cabelos são facilmente vistos em fundo branco. Você pode até sonhar em ter o banheiro mais branquinho do mundo, mas, na vida real, ele não permanecerá branco sozinho. Procure interpretar seus sonhos, seja coerente, razoável, ponderado. Cuidado, na vida real, eles podem se transformar em pesadelos.
mauricio.monteiro@bolamusic.com.br